Dilma e Sarney lamentam morte de Lelé, gênio e humanista
O falecimento de Lelé teve enorme repercussão no meio cultural e político do País
21 de maio de 2014 |
A presidente Dilma Rousseff divulgou nota oficial em que afirma que “o Brasil sofre uma profunda perda com a morte de João Filgueiras Lima, o Lelé, um dos nossos mais brilhantes arquitetos. Com sua rara criatividade e insuperável capacidade construtiva, Lelé provou que é possível fazer uma arquitetura social com inovação e qualidade. Ele foi ao mesmo tempo artista, cientista e humanista. Um grande brasileiro que merece nossa admiração e reconhecimento”.
“É uma perda muito grande para o nosso País, pois se trata de um gênio da arquitetura brasileira que nós perdemos”. Com essas palavras, o senador José Sarney (PMDB-AP), encerrou o pronunciamento de pesar que fez, no plenário do Senado, pela morte do arquiteto João Filgueiras Lima.
“Ele é o maior arquiteto brasileiro depois da morte do Oscar Niemeyer, de quem ele era um grande amigo, e trabalharam juntos”, afirmou Sarney, lembrando que Lelé participou ativamente da construção de Brasilia. “Muitos edifícios aqui têm a marca do seu talento e da sua genialidade. Foi o responsável pela construção do edifício do hospital Sarah Kubitschek, como também do Sarah Kubitschek Norte, que é um monumento de beleza arquitetônica, que realmente orgulha os arquitetos brasileiros”. O senador enviou mensagem de condolências ao CAU/BR.
A ministra da Cultura, Marta Suplicy, divulgou nota de pesar em que afirma que ele “deixou um legado não só na arquitetura, mas a todos que desejam dar à sua profissão um olhar inovador e voltado aos que mais necessitam”.
Sérgio Magalhães, presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), declarou que Lelé foi um arquiteto “que viveu para melhorar a vida das pessoas. Ele arquitetou durante toda a sua vida, fosse em áreas urbanas, em áreas pobres. Uma pessoa muito simples. A generosidade marcava sua arquitetura”.
Em entrevista ao jornalista Jotabe Medeiros, do “Estadão”, a filha do arquiteto, Adriana Rabello Filgueiras Lima, também arquiteta e que dirigia o Instituto Habitat, criado pelo pai, disse que Lelé foi “um gênio” tão grande quanto Oscar Niemeyer. “Tenho uma admiração enorme pelo trabalho do meu pai”, afirmou ela, que deixou a coordenação das obras da Rede Sarah de hospitais para tocar adiante o legado dele.
Adriana ressalva que Lelé também foi um tanto incompreendido – reclama que certos gestores são incapazes de compreenderem certas decisões técnicas do mestre. Em Salvador, por exemplo, executores da obra do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) querem eliminar todo o sistema de ventilação natural projetado por Lelé.
Ana Lúcia Niemeyer, neta de Oscar Niemeyer e presidente da Fundação que leva o nome do arquiteto, comovida, declarou que “Lelé não era apenas um arquiteto admirado por Oscar Niemeyer. Amigo querido, sempre presente e solidário. Ele se foi, mas deixou seu legado, sua arquitetura única, seu jeito de ser. Impossível pensar em Lelé sem sentir seu carinho. Conselheiro e colaborador da Fundação Oscar Niemeyer, amigo da família, saudades. ”
O jornalista Vicente Wissenbach, fundador e ex-editor da revista “Projeto”, acompanhou praticamente toda a trajetória profissional de Lelé e também não conteve sua emoção. “Além do domínio da arte e da técnica, Lelé sempre teve um profundo conhecimento dos problemas sociais brasileiros. A maior homenagem que poderia ser feita a ele é a concretização de seus projetos de habitação social para encostas de morros e outras áreas de risco”. O projeto foi apresentado à presidente da República, como parte do programa “Minha Casa, Minha Vida” para implementação inicialmente na favela Pernambués, em Salvador. Além de habitações, o plano contaria um bonde adaptado para trafegar em terreno ingreme, escola e área de lazer. Segundo dizia o arquiteto, é impossível pensar habitações de interesse social apenas reduzido às próprias habitações.
O governador da Bahia, Jacques Wagner (PT), manifestou sua solidariedade à família de Lelé, “um arquiteto que soube, como poucos, unir, nos muitos projetos realizados em várias partes do Brasil, os traços e linhas da sua técnica a uma forma artística, expressando toda a sua criatividade”.
Antônio Carlos Magalhães Neto (DEM), prefeito da capital baiana, afirmou que “as obras que Lelé projetou em Salvador ajudaram a consolidar o perfil l cosmopolita da cidade”.
Mário Kertész, prefeito de Salvador na época em que Lelé realizou vários projetos urbanos para a cidade, lembrou que o arquiteto “foi responsável pela elaboração do sistema de Transporte de Massa de Salvador (TMS). Fez projetos como o da Estação da Lapa, além de escolas, abrigos, postos de saúde com a tecnologia da argamassa armada. Não há nenhum outro arquiteto que tenha tido a influência e a intervenção na cidade de Salvador tão profunda quanto ele”.
O arquiteto Abilio Guerra, editor do portal “Vitruvius”, destacou que “Lelé “era antes de tudo um ser humano engajado no projeto coletivo de emancipação social. Esta postura existencial refletia no seu jeito de ser tranquilo e amoroso, em seus atos nobres, em suas obras magistrais. A arquitetura que desenhou foi concebida para ser construída, para gerar o conforto das pessoas, para oferecer dignidade. Passava ao largo da ambição pessoal e da forma espetacular e arbitrária, voltada exclusivamente para uma fruição estética vulgar. Todo o empenho na experimentação ao longo de toda sua vida foi uma busca incessante pela relação íntima entre projeto e programa de usos, regulada pela precisão construtiva e conforto ambiental. Um arquiteto completo. Mais um grande que se vai.”
O arquiteto Hugo Segawa, que se especializou em crítica arquitetônica trabalhando para a revista “Projeto”, convivei muito com Lelé e recebeu com grande impacto. Segundo ele, “embora tivesse um trabalho consolidado e reconhecido por todos, Lelé era uma pessoa iluminada, cuja grandeza não transparecia por sua extrema simplicidade no trato com todos”. Segawa o considerava até agora o maior arquiteto em atividade no País. “Trabalhando com Oscar Niemeyer, ele superou Oscar. Não que fosse melhor, mas seguindo a linhagem de Niemeyer, poeta da forma, Lelé criou a poesia da racionalidade, sem deixar de lado a dimensão estética de Niemeyer. O uso que ele fez dos materiais pré-fabricados, não é o burocrático, monótono, ao contrário é criativo e belo”. Além disso, Hugo Segawa realça que Lelé pensava na escala continental do País, buscando soluções que pudessem ser implementadas em todas as regiões, sem se basear numa só, por exemplo, em seus projetos de escolas e hospitais. “Ele pensou e realizou. Foi uma pena não ter encontrado condições para levar adiante seu Instituto Habitat, onde certamente ampliaria seu legado”.
Para a jornalista Bianca Antunes, editora da revista “aU”, Lelé foi “um daqueles entrevistados de quem passei de fã a muito-muito fã depois da entrevista. Andar com ele pelo Centro de Tecnologia da Rede Sarah e pelo Sarah Salvador foi uma das experiências mais ricas que tive em meu trabalho com jornalismo de arquitetura. Incrível a integração dele com operários e funcionários; incrível sua arquitetura. Ali entendi a função do arquiteto.”
Entrevistado pela “Folha de S.Paulo”, o arquiteto e crítico de arquitetura Fernando Serapião, da revista “Monolito”, disse que Lelé entendeu a capacidade industrial do Brasil e enfrentou os problemas cruciais de infraestrutura do País de uma forma genial, sempre inovando e apontando o lado possível da tecnologia brasileira.
Naia Alban Suarez, diretora da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia, disse em nota: “Como um dos maiores arquitetos do Brasil, Lelé foi um profissional exemplar, dedicando toda a sua vida, de forma abnegada, a constituir uma arquitetura social pelo viés da tecnologia e apuro estético, centrada na pré-fabricação”.
Giancarlo Latorraca, arquiteto e diretor técnico do Museu da Casa Brasileira, lembrou que Lelé “tinha uma visão integral da arquitetura, do detalhe do mobiliário à estrutura de um grande edifício e praticava esse caminho de integração entre todas as áreas mesmo depois do fim da obra. Os hospitais são o ponto máximo da construção humanizada, desse diálogo permanente com os usuários daquela construção. Ele deixou explicito quão longe os avanços da técnica arquitetônica brasileira podem chegar”.
“Lelé encarnava o ideal do arquiteto completo, dos primeiros sonhos que embalam o bom projeto ao rigor da construção no controle industrial de qualidade”, afirmou o arquiteto paulistano Marcelo Ferraz. “Ele tomou a arquitetura como ferramenta de atuação e transformação do mundo, na busca de conforto para as pessoas e comunidades inteiras. Lelé, acima de tudo era amigo de verdade, esbanjava carinho e generosidade”.
Glauco Beleza, arquiteto e amigo de Lelé, diz que “Lelé soube colher as soluções tecnológicas em sua essência e tranforma-las, quase reinventá-las, para criar arquiteturas e sistemas construtivos de caráter social e utilitário. Sua arte e engenho tinham esse sentido ético, de estarem voltados para o homem, para suas carências e para o seu bem-estar. Foi assim um grande arquiteto brasileiro que nos legou uma obra imorredoura, cheia de invenção, nobre e humana. Era uma pessoa admirável, de grande valor moral a altura de sua obra. Quando participei do Ceplan de Niemeyer na UnB, ele era o nosso líder incontesto. Sua influência e lição foram, para mim, inesquecíveis”.
Publicado em 21/054/2014, atualizado em 23/05/2014
Parabéns pela homenagem e solicito corrigir: Ana Lucia Niemeyer é neta e não filha de Oscar.
Corrigimos, Nivaldo. Agradecemos a atenção!